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Psicólogo mostra o que se esconde atrás das aparentes relações felizes
Aline e Ricardo estavam casados há quase dezenove anos e parecia que viviam felizes. Pelo menos apresentavam ao outros uma face alegre. Ricardo, um belo homem, proprietário de uma firma de materiais de construção, esforçava-se por manter a família em um nível elevado. Os filhos estudavam em colégios caros e usavam boas roupas. Moravam em uma casa confortável, num dos melhores bairros da cidade. Faziam com regularidade viagens de férias, até para o exterior. Cada um deles tinha o seu carro. Sua situação econômica, portanto, era bastante satisfatória.
Aline, talvez um pouco mais que Ricardo, era alegre e aparentemente extrovertida. Tratava todos com cordialidade, embora mantendo-os a uma certa distância. Quem conhecia o casal dizia que formavam um belo par e que tudo com eles corria bem.
Na verdade, o relacionamento do casal tinha todos os sinais de uma união feliz. Ricardo, sempre ocupado, fazia praticamente tudo o que Aline queria. Era um móvel novo que ela queria? Muito bem, comprava o móvel de sua escolha, sem discutir preço. Era um vestido de alto preço? O dinheiro sempre estava disponível.
No entanto, lá no seu íntimo, Aline guardava uma mágoa antiga: o marido jamais a convidava para coisas como jantar fora, ir a um teatro, e coisas assim. Se ela quisesse ir a algum lugar teria que tomar a iniciativa, sugerir ao marido. Este prontamente a atendia, sempre muito alegremente, mas isto não a satisfazia. Ela queria ser convidada. Parecia-lhe uma falta de interesse por ela, o que a deixava profundamente transtornada.
Um dia ela explodiu. Desabafou.
- Há anos que tenho uma coisa atravessada na garganta! Você nunca me convidou para nada. Sinto que não sou importante para você. É isso mesmo, não tenho nenhuma importância na sua vida. Você não pensa em mim. Sou um zero à esquerda. Vivo sonhando com o dia em que você entra por aquela porta com duas entradas para o teatro, ou me convida para jantar fora, mas isso nunca vai acontecer!
Ricardo esboçou uma explicação, mas o choro convulsivo da mulher fê-lo desistir.
Duas ou três semanas depois o marido chegou em casa mais cedo, com ar de mistério. Estava mais alegre que de costume. Folheou o jornal durante algum tempo, fazendo suspense e depois se dirigiu à esposa:
- Meu bem, hoje você não precisa pensar no jantar, vamos jantar fora. E ainda tenho duas entradas para vermos a Marília Pêra. Dizem que está ótima!
A mulher olhou bem para ele, com um ar que a ele pareceu de raiva, e respondeu:
- Agora não quero! Você só fez isso porque eu pedi, não foi uma coisa sua, espontânea.
Correu para o quarto, em prantos, enquanto o marido se perguntava o que havia de errado!
Neste episódio podemos ver claramente como é importante ter presente que Eu e o Outro somos diferentes. Já disse alguém que o segredo de uma convivência feliz é saber administrar as diferenças.
Aline naturalmente não se dava conta disso, mas ansiava por receber de Ricardo os cuidados e atenções que, por lhe terem faltado na infância a faziam sentir-se infeliz.
Ricardo, por outro lado, nascido em uma família pobre, entendia que a felicidade consistia em viver numa casa com todo conforto e em ter dinheiro para satisfazer todos os desejos.
Se ambos tivessem aprendido a arte do diálogo, certamente teriam podido fazer um ao outro felizes.
Por Durval Guelfi*
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